Um dos símbolos mais antigos de Belo Horizonte acaba de completar 80 anos este ano e pede como presente atrasado de aniversário maior respeito dos usuários e maior atenção do poder público. O oitentão em questão é o Viaduto Santa Tereza, inaugurado em setembro de 1929 para ligar o Centro a tradicionais bairros da Região Leste, como o Floresta, e cujas medidas impressionam: 390 metros de extensão, 13m de largura e 14m de altura.
Quem passa pelo elevado se encanta com os dois arcos parabólicos de 14 metros de altura cada, mas não deixa de reparar nos sérios problemas que ofuscam a beleza do cartão-postal projetado pelo engenheiro carioca Emílio Baumgart (1889/1943) e erguido sobre o Ribeirão Arrudas, a Avenida dos Andradas e a linha férrea da extinta Rede Ferroviária Federal S.A. (RFFSA)
A ponte não tem fissuras. Tampouco corre o risco de desabar. Suas mazelas são outras. Durante o dia, moradores de rua não se importam em transformar as escadas laterais do viaduto num imundo banheiro público: o cheiro de urina e de fezes é bastante forte. Há sem-teto que, depois de abusarem das garrafas de cachaça, usam os bancos debaixo do Santa Tereza para uma prolongada soneca. À noite, as lâmpadas de algumas luminárias estão queimadas e não oferecem iluminação para quem transita por ali.
Muitos pichadores se aproveitam do abandono do viaduto para rabiscar com tinta seus arcos. A escuridão ainda protege os sujões que afixam cartazes nas pilastras e encorajam os maus flanelinhas que se apoderam das vagas próximas ao oitentão. Alguns criminosos disfarçados de guardadores de carro exigem o pagamento adiantado de pelo menos R$ 10 em troca da condenada ‘olhadinha de mentira’. A Polícia Militar mantém um posto de observação debaixo da obra de arte, mas a quantidade de pichações mostra que, pelo menos por um curto espaço de tempo, os militares precisam se afastar do local de trabalho.
E, mesmo quando os policiais estão no elevado, é bom os cidadãos de bem ficarem atentos, pois há relatos de pessoas que foram assaltadas na ponte. “Estava batendo fotos do viaduto quando um homem me tomou a máquina. Isso foi num fim de tarde de 2008”, recorda o fotógrafo Cânsio de Oliveira, de 83 anos, que passou esta semana pelo Santa Tereza com uma fotografia antiga da Avenida Afonso Pena. Do tempo em que a via era rodeada por altos fícus. Ele critica ainda os pichadores que sujam o cartão-postal: “O viaduto podia estar melhor conservado. O povo não dá valor ao que tem”.
Seu Cânsio era um garoto quando o elevado foi inaugurado. A data precisa nem a prefeitura sabe ao certo. Oficialmente, informa apenas que o Santa Tereza foi entregue à população em setembro de 1929, mas não sabe especificar em qual dia. Em 8 de agosto de 1928, quando a construção dos arcos foi concluída (mas a ponte não estava liberada para a passagem), o Estado de Minas publicou uma reportagem elogiando o ritmo da obra. O título mostrou a importância do elevado: A ligação de dois grandes bairros ao Centro da cidade. A matéria se referia aos bairros Floresta e Santa Tereza.
Em dezembro daquele mesmo ano, quando boa parte do elevado estava concluída, as belas moças da cidade desfilavam pela ponte, como informa um texto da Belotur: (…) “O viaduto dá passagem para as moças que saíam da Floresta, num footing preliminar ao que aconteceria ao anoitecer na Avenida Afonso Pena”. Oitenta anos depois, é difícil mensurar a quantidade de pessoas que atravessam o cartão-postal. Mas, segundo a BHTrans, cerca de 1,6 mil veículos passam diariamente pelo Santa Tereza entre às 7h e às 9h. Das 17h às 19h, este número sobe para 3,5 mil carros, motos, ônibus e caminhões.
Limpeza
A Regional Centro-Sul informou que a varrição no viaduto – tanto na parte de baixo quanto na de cima – é diária e que a lavagem é feita duas vezes ao dia. As bocas de lobo são limpas duas vezes ao mês. Sobre os moradores de rua, a prefeitura assegurou que visita o local diariamente e os orienta a procurar abrigos da capital. A equipe social recolhe objetos abandonados pelos sem-teto, mas não pode obrigá-los a deixar o cartão-postal.